Publicado no Jornal A Tribuna, Vitória/ES, p. 23, em 08 de julho 2015
A palavra “corrupção” vem do latim corruptus, que significa “quebrado em pedaços”. Quer dizer, também, ato ou efeito de se corromper, oferecer algo para obter vantagem em negociata onde se favorece uma pessoa e se prejudica outra. É tirar vantagem do poder atribuído.
Em regra, o cidadão, equivocadamente, crê que somente existe desvio de conduta na esfera política, junto aos altos escalões do poder. Esquece-se que a corrupção cotidiana, consistente em levar vantagem sobre os outros nas mais ínfimas situações é tão reprovável quanto os atos de desvio de verbas públicas reiteradamente veiculados na mídia nacional.
A ausência de ética se percebe nas mais diversas ocasiões: é irrelevante se existe pagamento de propina ou o desrespeito à vaga de estacionamento de portadores de necessidades especiais. É irrelevante se há superfaturamento de obra pública ou um simples desrespeito à pessoa idosa.
O que diferencia uma situação da outra é apenas a gradação e as consequências de cada conduta, eis que, na essência, todas são reprováveis.
A corrupção está em todos os lugares e em todos os meios sociais. Pequenos atos voltados a levar vantagem em detrimento alheio, como não devolver o troco recebido a maior ou utilizar o acostamento de uma via em momentos de grandes engarrafamentos, igualmente, constituem atos de desvio de conduta que merecem um repensar, de modo a receber a devida reprovação social.
Temos que ter a percepção que o simples ato de desrespeitar o sinal de trânsito, não ceder o lugar especial em transportes públicos para a pessoa idosa, desrespeitar uma simples fila, correspondem a atos imorais, igualmente corruptos.
A cultura incutida no imaginário brasileiro de sempre levar vantagem ou de dar um “jeitinho” em tudo, colabora para o crescimento não só da micro, como também da macro corrupção. No mesmo sentido, adotar o famoso “sabe com quem está falando?” contribui para a massificação de uma cultura do favorecimento e do desrespeito aos direitos alheios, escancarando-se as portas para atos maiores de corrupção.
Para que me preocupar com aquele idoso que está de pé no transporte público lotado? Para que devolver o troco recebido a maior na padaria ao lado da minha casa? Porque não trafegar no acostamento em dias de engarrafamento?
Não preciso me preocupar com os problemas alheios. O que importa é o “eu”, o “meu” e nada mais. O “outro” não possui qualquer relavância, eis que a socidade autocêntrica fomenta o crescimento de um cidadão individualista, preocupado apenas com as próprias necessidades.
Cada vez mais é possível perceber que a alteridade é algo em extinção. Não há a preocupação com o outro. O que vale é somente o “eu-mesmo”.
Quem não respeita os direitos de seu próximo não pode exigir que seus direitos sejam respeitados. Quem não observa e se preocupa com as dificuldades e anseios alheios, não pode exigir que seus governantes sejam honestos.
Para que a sociedade possa exigir dos representantes atitudes honestas e pautadas na ética, faz-se necessário, primeiramente, “olhar para dentro” e começar a adotar, nas ações mais corriqueiras do dia a dia, posturas igualmente corretas.
Torna-se premente uma atitude simples: colocar-se no lugar do outro, enxergar-se no outro, para, assim, tentar entender que estacionar seu carro em uma vaga destinada ao portador de necessidades especiais, ainda que por meros cinco minutos, pode representar, para o outro, um obstáculo intransponível.
Não existe ser humano “meio honesto”. A honestidade é um conceito objetivo: o homem é ou não é honesto, sendo impossível ser ou exigir que alguém o seja pela metade.
Para que a sociedade exiga governantes honestos, que tratem com probidade a gestão da coisa pública, é preciso, primeiramente, que cada um “olhe no espelho” e decida se quer, efetivamente, adotar uma postura responsável e compatível com o perfil de um cidadão verdadeiramente comprometido com a ética.
Percebe-se, pois, que se procurarmos pela corrupção com “olhos de ver”, conseguiremos encontrá-la muito mais próximo do que imaginamos.
RODRIGO MONTEIRO
Promotor de Justiça e Mestrando em Direitos e Garantias Fundamentais (FDV).

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