MULHERES COOPTADAS PARA O CRIME- 2018

MULHERES COOPTADAS PARA O CRIME- 2018

Publicado no Jornal A Gazeta, Vitória/ES,  p. 15, em 22 de fevereiro 2018

Após à repercussão negativa da concessão de prisão domiciliar para a ex-primeira-dama do Estado do Rio de Janeiro, acusada de envolvimento com corrupção e desvio de verbas públicas, sob o fundamento de necessidade de sua presença ao lado de seus filhos menores, o STF analisou um habeas corpus coletivo apresentado pela Defensoria Pública da União em favor de mulheres submetidas à prisão cautelar, que ostentem a condição de gestantes ou de mães com crianças com até 12 anos de idade. Em suma, o pedido da Defensoria Pública sustentou que manter as crianças longe de suas mães “constitui tratamento desumano, cruel e degradante”. Restou sustentado, também, que “a política criminal responsável pelo expressivo encarceramento feminino é discriminatória e seletiva, impactando de forma desproporcional as mulheres pobres e suas famílias”. Outro argumento utilizado pela Defensoria Pública foi o art. 5º, XLV, da Constituição Federal, segundo o qual “a pena não poderá passar da pessoa do condenado” e, a manutenção da prisão de mulheres com filhos pequenos faria com que estes sofressem o impacto da privação de liberdade de suas mães. É inegável que o encarceramento brasileiro guarda relação direta com pessoas em situação de vulnerabilidade. Em sua maioria a população carcerária é formada por negros e pobres, em regra, desprovidos do direito fundamental de acesso à Justiça. A própria Defensoria Pública, incumbida pelo art. 134, da Constituição Federal, de promover a defesa judicial gratuita de pessoas necessitadas não consegue suprir a demanda. Isso faz com que pessoas pobres, homens e mulheres, não recebam uma defesa técnica adequada e capaz de preservar todos os direitos e garantias fundamentais. Prova dessa omissão estatal em relação aos direitos de pessoas em situações de vulnerabilidade social é a ausência de implementação da Lei nº 13.257/2016, que possibilitou a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar para gestantes e mães de crianças. É importante frisar que o pleito levado ao STF já é albergado por uma lei, bastando que haja sua aplicação. A ausência de uma política pública voltada ao atendimento jurídico de mulheres presas não pode servir de fundamento para que o Poder Judiciário decida “tapar o sol com a peneira”. A liberação indiscriminada e generalizada de mulheres grávidas ou com filhos menores causará uma inegável expansão das atividades criminosas no Brasil, eis que, tal qual atualmente ocorre com adolescentes que se envolvem com a criminalidade, haverá um maciço processo de aliciamento de mulheres para as entranhas do crime organizado. Inegável que a partir de agora ocorrerá a cooptação generalizada dessa “nova mão de obra especializada”. Os adolescentes infratores serão substituídos por mulheres com filhos menores ou em idade fértil. O número de detentas que ficarão grávidas com o único propósito de alcançarem a liberdade será enorme. Essas crianças irão nascer sem qualquer planejamento familiar e servirão apenas como verdadeiros “habeas corpus”. Com o propósito de se resolver um problema social, deu-se início a uma situação muito mais grave. Não é preciso entender de política criminal para se enxergar que o habeas corpus coletivo apresentado pela Defensoria Pública da União e acatado pelo STF ocasionará um significativo aumento da criminalidade. Os efeitos da decisão do STF ultrapassam a seara jurídica, eis que relacionados a uma verdadeira política pública criminal voltada ao desencarceramento em massa. Se continuarmos nesse caminho não será de se estranhar a defesa de um “Direito fundamental à reprodução assistida para as detentas com dificuldades de engravidar, como forma de garantia ao princípio da isonomia em relação àquelas que já alcançaram a liberdade”.

RODRIGO MONTEIRO 

Promotor de Justiça; Mestre em Direitos e Garantias Fundamentais (FDV).

  • Imagem pode conter direitos autorais, imagem retirada da página https://pedromaganem.jusbrasil.com.br/artigos/227216131/mulheres-nao-cometem-crimes