Publicado em A Gazeta, p. 17, em 01 de dezembro 2017
Os meios de comunicação repetem diariamente notícias que revelam como a administração pública brasileira está tomada pela corrupção. São desvios de toda ordem e a cada dia novos personagens corruptos (alguns não tão novos assim) são apresentados ao país. Ao analisar essa epidemia que solapa as riquezas do povo brasileiro resta relevante tecer uma reflexão: por que há tanta corrupção no Brasil? A culpa é exclusiva dos agentes públicos (e dos corruptores) que buscam ganhos fáceis às custas do sofrimento de toda a sociedade? Penso que não. É possível encontrar agentes públicos corruptos em Marte ou no fundo do oceano? Talvez nesses locais (ainda) não haja corrupção ante à ausência de uma sociedade que tem seus valores moldados na busca incessante pelo “se dar bem”. A sociedade brasileira vivencia uma inegável crise ética. Egoísmo, autocentrismo, patrimonialismo e ausência total de alteridade são características indeléveis de nossa sociedade. O meu problema é sempre maior do que o problema alheio; a minha pressa é sempre maior do que pressa alheia e em razão disso me permito não respeitar as mais básicas regras de convivência social. Por que obedecer às leis de trânsito? Por que não furar a fila? Por que não apresentar atestado médico falso? Por que não falsificar carteira de estudante? Por que corrigir o garçom quando recebo uma conta errada? Por que alertar ao professor quando a soma da minha nota estiver equivocada? Pessoas comuns com comportamentos dessa natureza, certamente, se tiverem a oportunidade de atuarem como gestores de contratações estatais irão desviar recursos públicos. A premissa é a mesma. Ética é como gravidez: não existe mulher “meio” grávida e não pode existir cidadão “meio” ético. Ou se é ou não se é ético. Esse cidadão que vive sempre buscando levar vantagem em tudo, em sintonia com o famoso “jeitinho brasileiro”, ao olhar para o espelho inegavelmente enxergará a imagem daqueles agentes públicos que sagram o país. Boa parte de nossos agentes públicos somente está preocupada com a satisfação dos próprios interesses pois essa é a mensagem que lhes é passada pela sociedade. Essa relação é cíclica e se retroalimenta. Enquanto não percebermos que esses “inocentes” desvios comportamentais são alimento para a ausência de ética e alteridade em toda a sociedade estaremos fadados a acompanhar, diariamente, novas e novas notícias sobre desvios de conduta na administração pública brasileira. A mudança que esperamos e precisamos não virá de Brasília. A mudança deve partir de cada um de nós. A mudança é contra majoritária e precisa começar de baixo para cima. Devemos educar nossos filhos a partir de premissas e, sobretudo, de exemplos positivos pautados na ética, para que as próximas gerações ao menos tentem mudar o paradigma atual. A geração presente se mostrou incapaz de transformar o Brasil em um país melhor. Oxalá nossos filhos e netos consigam aquilo que não tivemos competência para fazer: um país mais justo e ético.
RODRIGO MONTEIRO
Promotor de Justiça; Mestre em Direito

- Imagem retirada da página https://casavogue.globo.com/Design/noticia/2013/07/espelho-reflet-claire-lavabre.html