Reforma Polpitica, SIM; Cabo de Guerra, NÃO
Há anos a sociedade brasileira clama por uma reforma política coerente, responsável, capaz de sufragar as discrepâncias vivenciadas no sistema eleitoral nacional, que prestigia o poderio econômico e o caudilhismo, em detrimento do surgimento de novas lideranças.
O sistema vigente permite, por exemplo, que pessoas escolhidas a partir de interesses partidários pouco democráticos, sejam eleitas com um quantitativo desproporcional de intenções populares, em virtude de vinculação a candidatos populares, “puxadores de votos”.
A título exemplificativo convém lembrar o caso de Enéas Carneiro, eleito deputado federal em São Paulo, no ano de 2002, com mais de 1,55 milhão de votos — maior votação em eleições proporcionais na história do país. O candidato do extinto Partido de Reedificação da Ordem Nacional (PRONA) levou outros cinco dos sete concorrentes do partido à bancada paulista na Câmara Federal, destes, foi eleito o Sr. Vanderlei Assis, que garantiu seu lugar em Brasília com apenas 275 votos. Distorções dessa natureza precisam ser extintas, entretanto, não conseguiremos fazê-lo do modo como a Câmara dos Deputados tem sido conduzida.
Percebemos que há um evidente cabo de guerra entre e Câmara e o Governo Federal, motivado não pelo interesse público, que deve sempre nortear as discussões do parlamento, mas sim, por disputas pessoais de poder e vaidades.
Nesta semana houve o início da votação da Proposta de Emenda Constitucional n. 14 (PEC da reforma política), com a derrota da iniciativa apoiada pela Mesa Diretora, voltada à criação do chamado “Distritão”, sistema em que deputados e vereadores seriam eleitos de forma majoritária, através de repartições territoriais em cada estado (distritos).
Em razão da derrota nessa votação, lideranças da Câmara dos Deputados iniciaram um verdadeiro cabo de guerra com o Palácio do Planalto e partidos pequenos, movidos pelo sentimento de revanchismo, promoveram alterações que servirão, tão somente, para obscurecer o sistema político nacional.
A proposta de proibição a doações de empresas privadas a campanhas eleitorais que havia sido rejeitada pela Câmara dos Deputados no último dia 26/05, foi, posteriormente submetida a nova votação e, mediante um jogo de interesses e com uma manobra regimental, houve a aprovação da medida. Nesse contexto, permitiu-se que empresas façam doações obscuras a candidatos determinados, por meio dos respectivos partidos. Antes, era possível conhecer os destinatários das doações, agora, não mais. Os caciques das grandes agremiações partidárias se tornarão ainda mais poderosos.
Outro ponto alterado na votação ocorrida na noite de 27/05 se refere ao fim da reeleição aos cargos de chefe do Poder Executivo (presidente, governador e prefeito), modelo criado no Brasil no final da década de 1990. Com a reeleição, na prática, há um mandato de oito ano, com a possibilidade de avaliação popular no quarto ano. Na prática, se o governante houver trabalhado corretamente, conseguirá a reeleição.
Caso contrário, seu mandato é interrompido e inicia-se uma nova gestão. Tal sistema é muito recente e ainda não foi possível concluir se a reeleição é ou não coerente com os anseios da nação. Decerto, essa alteração não ocorreu com o objetivo de buscar melhorias ao povo brasileiro, mas sim, como um revanchismo obtuso.
O descalabro maior do sistema eleitoral encontra-se na forma desarrazoada de escolha dos membros das Casas Legislativas, que permite a eleição de parlamentares que não possuem qualquer compromisso com o povo, mas sim, com interesses fisiológicos e institucionais. Os partidos políticos (sejam de esquerda ou de direita – se é que ainda existe essa dicotomia) almejam o poder com a finalidade única de perpetuarem-se nos privilégios.
Fica a indagação: há interesse numa verdadeira reforma política?
RODRIGO MONTEIRO
Promotor de Justiça e Mestrando em Direitos e Garantias Fundamentais (FDV).