SOMOS TODOS CORRUPTOS?  – 2016

SOMOS TODOS CORRUPTOS? – 2016

Publicado no Jornal A Tribuna,  Vitória/ES,  p. 19, em 09 de dezembro 2016 

Hoje, 09 de dezembro, celebra-se o dia internacional de combate à corrupção. Torna-se relevante tecer uma análise sobre o momento sensível vivenciado pela sociedade brasileira, eis que após a coleta de milhões de assinaturas em um projeto de iniciativa popular vocacionado a frear a corrupção, nos deparamos, numa madrugada em que todo o Brasil apresentava-se consternado e de luto, com o fato de que nossos parlamentares, na surdina, dilaceraram as medidas anticorrupção formuladas pelo povo, numa clara demonstração de falta de compromisso e respeito para com os reais detentores do poder: o povo! Restou claro que os representantes eleitos para gerir os interesses da nação estão conduzindo o Congresso Nacional com a finalidade única de autopreservação, eis que, segundo o site congressoemfoco, cerca de 30% dos deputados federais e 40% dos senadores, figuram como réus junto ao Supremo Tribunal Federal. Nesse contexto, importante tentar entendermos se, realmente, a atuação desses parlamentares encontra-se isolada daquilo que é praticado na “vida real” ou, de outra sorte, se existe uma verdadeira relação de reciprocidade para com a sociedade brasileira. Assim, necessário que se questione: existe corrupção apenas nos bastidores do poder? É muito comum que o cidadão se inquiete com as reiteradas notícias de corrupção que habitam os meios de comunicação, porém, “esqueça-se” de observar regras de conduta diárias, comportamentos éticos que deveriam ser buscados no cotidiano. Esse sentimento de que somente existe corrupção na Administração Pública merecer ser desconstruído. É preciso analisar o problema do enfretamento à corrupção não apenas sob o viés do Estado, mas sempre lembrando que se as práticas ilícitas têm persistido por tanto tempo no Brasil, é porque isso está arraigado à própria sociedade, fazendo parte indissociável de nossa cultura. A assunção de responsabilidades por parte da sociedade é medida de extrema urgência, de modo que nasça um sentimento de repulsa não apenas aos atos de corrupção praticados pelos agentes públicos, mas, também, quanto aos atos diários, corriqueiros, perpetrados pelo homem comum, numa inequívoca exaltação do conhecido “jeitinho brasileiro”, vinculado a buscar vantagens que não seriam obtidas em condições objetivas de normalidade, mediante arranjos vivenciados em um sistema legal paralelo à realidade social. É evidente que a sociedade não pode ser culpada por todos os infortúnios que assolam nosso país. À sociedade não cabe o ônus pelos reiterados atos de corrupção que ocorrem a cada dia. De outra sorte, não há como sustentar a isenção total dessa responsabilidade. A propagação do “jeitinho brasileiro” cria uma nova geração de cidadãos aproveitadores e, infelizmente, o “levar vantagem em tudo”, permanece no imaginário do cidadão brasileiro, fato que contribui para a propagação de atos de corrupção na política e, sobretudo, no seio da sociedade. Numa sociedade em que o incentivo para desrespeitar as regras é muito maior do que o de respeitá-las, ser honesto não é o melhor caminho a ser seguido. No seio de uma sociedade moldada a buscar sempre o levar vantagem em tudo nasce um verdadeiro círculo vicioso da corrupção, em que não há inocentes, estando todos os atores do processo engajados no mesmo desejo egoístico de sair vencedor, a qualquer preço. Restará infrutífero o árduo e incansável trabalho de combate à corrupção no serviço público se, de igual forma, não houver uma ruptura total com o modelo vivenciado na sociedade brasileira. De nada adianta dar início a uma cruzada contra agentes públicos corruptos, se o modelo social vigente não for revisto, de modo a se buscar uma completa mudança nos padrões éticos de toda sociedade brasileira.

RODRIGO MONTEIRO

Promotor de Justiça; Mestre em direitos e garantias fundamentais pela Faculdade de Direito de Vitória. 

 

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